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Onde mora o brasão

Em entrevista ao grupo Pomeranos no Vale Europeu, Arno Teichmann, filho de Erwin Curt Teichmann, fala sobre a obra de seu pai

O brasão de Pomerode, deve encher cada morador de extremo orgulho. Cada traço, cada elemento, cada detalhe, estão carregados de significados e simbologia. Esse feito, realizado na década de 1960, demonstra de forma única, toda a ancestralidade, a força, a vocação e o amor pelo local escolhido para viver.

Nesse contexto, um alemão assume um papel preponderante quanto a construção dessa identidade, desenvolvendo um Brasão carregado de pesquisa e significados. Erwin Curt Teichmann nasceu em 1906 em Kiel (Norte da Alemanha), chegando ao Brasil com seus pais em 1913, se fixando em Blumenau. Posteriormente a família migrou para Albertina, uma localidade no interior de Rio do Sul, e resolveram se dedicar à agricultura. Erwin aprendeu sobre os desafios do campo e de certa forma a luta pela sobrevivência em meio à mata virgem que precisava ser preparada para o cultivo.

Registro: vista parcial do Centro de Pomerode em meados de 1936, período próximo em que Erwin Curt Teichmann se estabeleceu no Vale do Rio do Testo. Foto: Livro Im Kamp und Urwald Südbrasiliens de Hugo Grothe (acervo do Museu Pomerano de Pomerode)

Em 1933 se casou com Herta Weiss, no mesmo ano prestou o exame de suficiência para professor de primário se classificando em primeiro lugar. Havia uma preocupação em prover sustento para a família que estava se formando. Durante cinco anos lecionou no Alto Vale. Herta sofria de reumatismo, o que fez com que voltassem para Blumenau onde encontrariam mais recursos para tratamento.

Em 1937 fixou residência em Testo Central, pois todo o Vale do Rio do Testo (Pomerode) ainda fazia parte da grande Blumenau. Erwin intercedeu com o prefeito de Blumenau assumindo o cargo de professor na Escola Municipal Testo Central (Escola Básica Municipal Olavo Bilac). Além das aulas de português, ministrava educação física, técnicas de plantio, canto e tocava cítara (uma herança de seu pai Joseph). Herta o auxiliava ministrando aulas de trabalhos manuais e confeccionando os uniformes dos alunos.

Rascunho: Grifo da Pomerânia esboçado por Erwin Teichmann e que compõem o brasão de Pomerode. Foto: Acervo Arno Hercílio Teichmann

Naquele momento, Erwin já dividia seu tempo entre a arte e a função de professor de português (numa época em que a língua alemã era totalmente fluente no cotidiano do pomerodense). Um ponto interessante é que ele entendia que a escola era a única fonte de resgate da cultura, convenhamos, estava muito certo considerando aquele período. Com a chegada da nacionalização, em 1938 foi exonerado mediante a lei sancionada que não permitia que estrangeiros lecionassem.

Então, ele projetou a ideia de abrir uma escola para alfabetizar adultos no período noturno, notadamente visionário para a época. Erwin Teichmann realizava entalhes e trabalhos com barro, pois quando criança ajudava seu pai Joseph a finalizar os projetos. Daquele momento em diante, após a exoneração, se ocupou exclusivamente com a escultura e as mais variadas formas de expressão artística. Pintura em óleo sobre tela, xilogravuras, modelagem em barro e em porcelana, e, sua maior paixão, o entalhe em madeira.

Elemento: esboço da Harpia/águia que passou a compor o brasão de Pomerode. Foto: Acervo Arno Hercílio Teichmann

O primeiro passo sempre era desenhar o que viraria uma escultura, depois talhava num pequeno bloco para então iniciar a obra definitiva. Em 1945 consegue uma sonhada exposição no Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro. Em 1946, expôs na galeria Itá (São Paulo), lá conheceu o diretor da Porcelana Schmidt S.A. que ficou impressionado com as obras do artista convidando-o para trabalhar na fábrica de porcelanas em Pomerode. Iniciava-se um novo ciclo em sua vida.

Ainda em 1948 expôs em Porto Alegre e Curitiba. No período de 1955 a 1971 se dedicou a Porcelana Schmidt trabalhando como designer e modelador de arrojados bules e xícaras, como também bustos e os cavalos que marcaram a vida de Teichmann. Com os recursos oriundos das exposições em grandes centros no Brasil à fora, construiu em 1950 a casa que atualmente abriga relevante acervo.

Esboço: uma das versões do brasão de Pomerode antes do oficial. Tinha como elemento o urso para representar a fauna e o zoológico, no entanto, na versão final acabou sendo substituído pela Harpia/águia. Foto: Acervo Arno Hercílio Teichmann

A casa do escultor Erwin Curt Teichmann respira arte, podemos perceber a genialidade de Erwin em cada detalhe, em cada trabalho. Na madeira, na porcelana, nas pinturas, nos inúmeros protótipos, ou seja, pode-se sentir essa genialidade em cada canto. A casa Teichmann abriga um justo título, ONDE MORA O BRASÃO de Pomerode.

Foi na casa Teichmann próxima ao Portal Sul que nasceu o Brasão municipal, lá estão os estudos e os primeiros esboços, um acervo de elevada importância histórica o qual gentilmente Arno Teichmann (filho de Erwin) apresentou ao grupo Pomeranos no Vale Europeu em 12 de agosto de 2023. Quando Pomerode se emancipou em 1959, era necessário fortalecer sua identidade, e certamente, Teichmann teve um papel determinante nisso.

Versão: brasão de Pomerode feito pelas mãos de Erwin Curt Teichmann, sendo o esboço final. Foto: Acervo Arno Hercílio Teichmann

A propósito, em 2024 os parabéns são para o município de Pomerode que celebra 65 anos de emancipação, e ainda, celebramos o bicentenário da imigração alemã no Brasil (1824/2024). Foi na gestão do prefeito Arnoldo Hass que Erwin idealizou o Brasão de Pomerode. Em carta oficial, Arnoldo Hass convida Teichmann: “…cabe-me com muita honra convidar oficialmente V.S. para ser o executor e o idealizador da Armas do Município, o qual solicito e lhe dou amplos poderes para confeccioná-la”, declarava o então prefeito.

Os significados dos símbolos concebidos por Erwin, compõem a lei nº 74 de 18 de fevereiro de 1964, que instituiu oficialmente o Emblema Municipal, escudo do município. Os elementos selecionados, demonstram a elevada capacidade de compreensão e respeito aos pomerodenses que Erwin Teichmann tinha, que além do Brasão também concebeu a bandeira do município. Sobre isso, cabe destacar que apesar da definição em lei das cores da bandeira de Pomerode simbolizarem amor e paz, entendemos que o azul e branco remonta de outra origem.

Símbolos: Brasão do município de Pomerode. A coroa de alvenaria simboliza a unidade administrativa e a segurança municipal. Na esquerda acima o escudo é ocupado pelo grifo da Pomerânia (destacado com círculo preto e editado por Genemir Raduenz). Na direita o campo subdividido acima simboliza o artesanato na cor azul e logo abaixo em campo vermelho a roda branca representa a indústria de porcelana. Embaixo à esquerda em campo vermelho a figura representa as ferramentas típicas e originais dos colonos, já na direita embaixo uma harpia simboliza a fauna e o zoológico. No centro do brasão há um escudo menor, aparecendo em destaque as cores nacionais verde e amarelo, representando o sentimento da população. Abaixo em forma de laço destaque para o ano de 1863 que se refere ao início da colonização em Pomerode e 21 de janeiro de 1959 que é a data da instalação do município. Fonte: www.pomerode.sc.gov.br

Nesse aspecto, precisamos fazer um recorte histórico para compreender a história relacionada e porque carregamos as cores azul e branco em Pomerode. Ao observarmos a bandeira da Pomerânia, ela tem uma composição muito parecida com a de Pomerode, no centro está o grifo da Pomerânia e há as faixas em azul e branco.

O azul simboliza o mar (a vasta costa Báltica) e a faixa branca simboliza a areia das praias. No livro de Klaus Granzow de 1975 intitulado “Pommeranos unter dem Kreuz des Südens (Pomeranos sob o Cruzeiro do Sul)” na passagem dele por Pomerode, ele se impressiona e destaca: “As margens da estrada encontramos crianças loiras de cabelos cacheados indo para a escola. Elas usam orgulhosamente o uniforme azul e branco. Sendo as saias e calções de cor azul e as blusas e camisas brancas. Os homens e as mulheres que trabalham na roça estavam com o rosto queimado pelo sol, mas pareciam-me tão familiar como se já os tivesse encontrado numa rua na Pomerânia Oriental”.

Memória: Brasão do município de Águas de Lindóia que serviu de inspiração para a criação do Brasão de Pomerode. Foto: Acervo Arno Hercílio Teichmann

Klaus nasceu na Pomerânia e ao passar por Pomerode o azul e branco chamam sua atenção, além do sentimento de já conhecer as pessoas que encontrou. Ainda sobre a bandeira da Pomerânia, ao centro está o grifo que recebe um destaque especial. Helmar Reinhard Rölke descreve no livro “Descobrindo Raízes” as principais características do GRIFO: sempre na cor vermelha ele é apresentado em perfil, sendo a parte frontal na forma de águia de asas abertas representando a constante necessidade de VIGILÂNCIA deste povo (muitas guerras), pois a águia tem a característica de “enxergar bem”.

A parte traseira do corpo representa um leão expressando a FORÇA dos pomeranos. A referência mais antiga ao grifo data do ano de 1194. Nessa data a duquesa Anastasia, juntamente com seus filhos Bogislaw II e Kasimir II, doam à igreja Santa Maria de Kolberg, a vila de Buggentin. Esse documento de doação não existe mais em sua condição original, somente uma cópia do ano de 1384 onde o grifo é mencionado claramente.

Registro: autorretrato de Erwin Curt Teichmann. Foto: Imagem extraída do Livro “Vida e Obra do Escultor” de Jerusa Ivany Cardoso Raduenz

Inicialmente o grifo era usado como selo em documentos para comprovar autenticidade, sendo impresso numa espécie de massa/parafina. O grifo pomerano mais antigo e conservado é o que aparece num documento de 29 de setembro do ano de 1214. De forma curiosa, nesse documento os duques pomeranos Bogislaw II e Kasimir II conferem ao convento de Trebnitz na Silésia o direito de poder enviar uma vez ao ano um navio para a Pomerânia para comprar arenque (Hering), sem ter que recolher impostos.

Ao longo dos séculos o grifo se tornou símbolo de poder e foi adotado como brasão da Pomerânia. Muitos elementos evidenciam claramente a influência da Pomerânia na formação da identidade de Pomerode, o azul e branco de ambas as bandeiras e o grifo da Pomerânia no canto esquerdo superior do brasão da nossa cidade são aspectos por si só que fortalecem esse laço. Desta forma, vamos discorrer brevemente sobre alguns fatos históricos que nos conectam com a origem do grifo da Pomerânia.

Num recorte cronológico, podemos referenciar o povo chamado Wendes. Segundo Helmar Reinhard Rölke, eram nômades de origem eslava que aos poucos começam a se fixar próximo ao litoral do Mar Báltico, formando pequenas vilas. O trabalho na terra é aprimorado surgindo as primeiras colônias. Um povo hospitaleiro, perseverante, que se contenta com pouco sendo amante da liberdade.

Arquivos: Arno Hercílio Teichmann na casa da família Teichmann apresentando todo o acervo de documentos e esboços que fizeram parte dos estudos de Erwin para compor o Brasão de Pomerode. Foto: Edson Klemann

Eles também têm uma íntima relação com a natureza. Na língua Wende o termo PO MORJE significa terra perto do mar. O Nome Pomerânia provém deste termo. Na Pomerânia a terra é baixa com muitos lagos e rios, por este motivo, muito propícia para a produção de alimentos. Rölke afirma que isso atraiu a cobiça dos povos vizinhos que começaram a se interessar e invadir esta região.

Em função destas constantes invasões, os pequenos lavradores começam a procurar a proteção de famílias maiores e mais poderosas. Em troca, os lavradores precisam trabalhar para seus protetores. Com o tempo surge a figura do Duque. Os Duques são os chefes de uma determinada região e exercem sua autoridade organizando a vida de todas as classes. Os principais duques da Pomerânia eram da linhagem dos Grifos.

Esta linhagem recebeu este nome porque adotou em seu brasão o Grifo, uma figura mitológica babilônica, grega e romana. Boa parte dos imigrantes pomeranos que vieram para Pomerode viviam nestes feudos, mais conhecido no Brasil como latifúndios. O nome do município, deixa evidente o lastro de Pomerode com a Pomerânia (Pommern), unindo o radical “Pommern” e o verbo “roden”, verbo em alemão que significa tirar os tocos de árvores, tornar a terra apta para o cultivo.

Em Pomerode: Vista parcial do Museu Teichmann com uma das obras de Erwin no jardim. Foto: Edson Klemann

Os primeiros imigrantes se dedicaram à agricultura, e isso tinha que acontecer em seus lotes coloniais cobertos pela Mata Atlântica. O sufixo “Roda” ou “Rode” faz parte de nomes de lugares na Alemanha que surgiram de áreas desmatadas, locais que foram fundados principalmente no final da Idade Média. Certamente tudo isso foi considerado por Erwin, as cores azul e branco, a relevância do grifo vermelho da Pomerânia e a origem camponesa da maioria dos imigrantes.

Por sua vez, Erwin também utilizou como base em seus estudos a estrutura dos brasões dos municípios de Águas de Lindóia e de Passo Fundo, que serviram de inspiração quanto a “formatação” do escudo, no entanto os elementos/símbolos, foram estudados e desenvolvidos baseados na história de Pomerode. Considerou a ancestralidade e a prosperidade, ou seja, a trajetória do povo daqui.

A riqueza dos detalhes como as ferramentas dos pioneiros, o grifo da Pomerânia, a relevância do artesanato e da industrialização e o zoológico enaltecem essa jornada. Todo esse processo de estudo e elaboração/criação percorreu o tempo aproximado de dois anos. Erwin Curt Teichmann é considerado um artista completo, por exemplo, entre o período de 1954 a 1966 esteve à frente da criação e direção de peças teatrais tendo como elenco 30 figurantes compondo o denominado Grupo Cultural de Pomerode.

Peças como Die Kratzbürste (O Piralho), Wenn der Hahn Kräht (Quando o Galo Canta), entre outras, fizeram parte das oito peças e mais de 70 apresentações em toda a região. De fato, um homem de destaque na comunidade, pela sua criatividade, inteligência, disciplina e respeito. Deixou um legado que ainda é subestimado, mas está tudo lá, na casa ONDE MORA O BRASÃO.

Redação: Grupo Pomeranos no Vale Europeu – Genemir Raduenz, Edson Klemann, Johan Strelow e Cláudio Werling

Nossa história preservada através das nossas memórias

In den 1930er Jahren

Das in den 1930er Jahren erbaute Haus war der Wohnsitz von Alwin Blank, dem ersten Schuhmacher in der Ortschaft Rio do Testo, der heutigen Gemeinde Pomerode. Im Laufe der letzten Jahrzehnte wurde das Gebäude mehrfach umgebaut, um seine kommerziellen Zwecke zu erfüllen. Zwischen 1988 und 2007 befand sich hier das Restaurant und die Konditorei Torten Paradies.

Foto: Heike Weege/Fotos Antigas Pomerode

2024

Construída na década de 1930, a casa foi residência de Alwin Blank, o primeiro sapateiro do Distrito do Rio do Testo, atual Pomerode. Nas últimas décadas, o imóvel passou por várias adaptações para ter a função comercial. Entre os anos de 1988 e 2007 foi a sede do Restaurante e Confeitaria Torten Paradies.

Foto: Marta Rocha

Agradecimentos

Senhor Arno Hercílio Teichmann, que gentilmente nos recebeu mostrando todo o acervo documental com relação ao desenvolvimento do Brasão de Pomerode e muitos outros relatos históricos sobre seu pai Erwin Curt Teichmann • Dirceu José Zimmer (tradução) • Roseli Zimmer • Museu Pomerano • Heike Weege/Fotos Antigas Pomerode

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