Em 2023 Pomerode comemora um importante marco, os 160 anos de imigração. Foi em 1863 que os pioneiros chegaram ao Vale do Rio do Testo, então colônia Blumenau. Na mala, trouxeram esperança, fé, coragem e também costumes e tradições. Entre eles, a música.
Nesse contexto, um dos instrumentos que mais representam a cultura pomerana se transformou, ao longo desse mais de um século e meio, numa das marcas da preservação cultural pela qual Pomerode se tornou conhecida e reconhecida em todo o Brasil e também no exterior. Estamos falando do bandoneon.
Atualmente é possível ver muitas crianças e adolescentes, meninos e meninas, que escolheram aprender o tradicional instrumento, muitos deles frequentam a Escola de Bandoneon Amigos do Fole, cujas aulas são ministradas pelo músico e professor Rodrigo Kienen. Mas, nem sempre foi assim.
O descendente de imigrantes, Roberto Maske, hoje com 49 anos, lembra-se dos tempos em que o pai, Arno Maske, um talentoso musicista, levava consigo o desejo de ensinar o bandoneon para as novas gerações. “Meu pai tinha a Funilaria Maske, que hoje é a Metalúrgica, então participava dos encontros da Acip, que eram feitos no Recanto do Salto. O pai do Sandro [Romig] tinha uma Eletrônica e também participava das reuniões”, lembra Roberto.
Em muitas ocasiões, Arno levava consigo o bandoneon que, segundo lembra Roberto, andava um tanto quanto esquecido na época, uma vez que apenas os mais velhos sabiam tocá-lo. “Em certo momento ele comentou que gostaria de ver um menino tocando aquele instrumento. Foi então que o pai do Sandro [Ingo Romig] disse: ‘eu tenho um menino e gostaria que ele aprendesse’”.
Dias depois, pai e filho foram à casa de Arno, para iniciar as aulas. Isso despertou interesse em Roberto, que pediu ao pai que também lhe ensinasse. Assim, em 1984, os garotos deram início a dupla que, um pouco mais tarde, ficaria conhecida como os “Meninos Pomeranos”.
Notas de reencontro
Conforme conta Roberto, o bandoneon é derivado da Concertina. Foi em meados de 1850 que Heinrich Band tornou o instrumento conhecido e, a partir daí, ele se espalhou pelo mundo. Sobre a origem do nome, Roberto explica. “Ele tinha uma cooperativa ‘Union’, então o nome do instrumento juntou o Band (sobrenome) mais o Union (cooperativa). O bandoneon consta em várias imagens que mostram que os imigrantes o traziam junto, na mala”, elucida.
Muitas décadas mais tarde, o instrumento andava um tanto esquecido pelos músicos da então Pomerode. “Meu pai aprendeu com 29 anos. Para isso, buscou aulas com Richard Schweder, que morava na localidade de Garibaldi, em Jaraguá do Sul. Ele ficou lá por algumas semanas e, em troca das aulas, ajudava nos afazeres da propriedade.”
Embora atuasse profissionalmente em outra área, Arno jamais deixou de lado a carreira musical. Participou da fundação da Banda Jazz Arno, que curiosamente era composto por três Arno’s: Arno Güths, Arno Wachhholz e o próprio Maske. Além da amplamente conhecida e reconhecida Banda Lyra.
Ao longo da caminhada, sentia o desejo profundo de que as novas gerações aprendessem bandoneon, para que o instrumento não ficasse esquecido em cristaleiras, amontoando poeira. Foi agraciado com os Meninos Pomeranos e com outros que vieram a seguir.

Uma valsa e uma marcha
Roberto e Sandro iniciaram as aulas em meados de setembro de 1984, já em outubro daquele ano tocaram pela primeira vez no aniversário do então prefeito, Eugênio Zimmer, o China. “Só sabíamos tocar duas músicas. De imediato ele disse que nós iríamos participar do desfile da Oktoberfest. Desfilamos a Rua XV (Blumenau) revezando entre uma valsa e uma marcha. Depois disso, sabíamos de cor e salteado”, diverte-se Roberto.
A fama dos meninos que tocavam bandoneon logo se espalhou e eles foram convidados para diversas apresentações. Assim, tiveram que intensificar as aulas para aprender muitas outras músicas e aumentar o repertório. “Quando chegávamos numa festa, as pessoas já se posicionavam na frente do palco esperando a hora que fôssemos tocar. No fim de 1986, gravamos um LP, não foram praticamente nem dois anos de estudo. Foi muito rápido.”
Daquela valsa e daquela marcha, muitas oportunidades nasceram. Em 1985, Os Meninos Pomeranos se apresentaram na Festa Pomerana, em cima de mesas, durante o almoço. Logo depois, foram abordados por um empresário que os convidou para representar a extinta Gaitas Hering na Feira de Instrumentos Musicais na Bienal do Ibirapuera, em São Paulo. A experiência se repetiu por três anos, no último deles, Roberto e Sandro fizeram a primeira viagem de avião, algo marcante e também assustador. “O problema é que fomos pelo aeroporto Quero-Quero até Congonhas, e fomos com Taxi Aéreo com 16 passageiros, era um pequeno bimotor, que a qualquer nuvem chacoalhava muito. Era muito bom e, ao mesmo tempo, deu medo”, confidencia.

Semente plantada
Roberto continuou estudando música, além do pai teve outros professores. Em dado momento, chegou ao Teatro Carlos Gomes, onde estudou violino por sete anos. A associação entre os dois instrumentos trouxe um rico conhecimento a ele. Ainda era jovem quando se tornou professor, recentemente lecionou também na Escola de Bandoneon. “Muitas crianças e adolescente passaram por mim, não só para aprender bandoneon, mas também teclado. E hoje é um orgulho quando os vejo em outras bandas, perceber que foram adiante na área musical e que começaram comigo”, revela.
Quando questionado sobre ver crianças e jovens aprendendo a tocar bandoneon, reflete: “Fico imaginando se meu pai estivesse vivo hoje ainda, acho que ele ia ficar muito orgulhoso pelo que foi plantado naquele tempo e que hoje deu muitos frutos.”
Os frutos
Vinícius Uessler, de apenas 10 anos, exibe um largo sorriso no rosto quando fala da experiência de aprender a tocar bandoneon. Ele começou as lições em 2022, na Escola de Bandoneon, tendo o professor Rodrigo como mestre.
Mas o interesse pelo instrumento começou em casa. O pai de Vinícius, Irineu Uessler, de 46 anos, aprendeu a tocar quando jovem. Ele conta que chegou a ter aulas com Arno Maske e sempre gostou de tocar em casa, mas nunca havia se apresentado. Quando Vinícius viu o pai tocando, pediu para aprender.
Foi então que a mãe, Mariane, 46 anos, sugeriu que os pais levassem o filho à Escola de Bandoneon. “Eu vi meu pai tocando e aí quis aprender. Foi mais ou menos difícil, ainda estou nas músicas curtinhas”, revela o menino.
O garoto gostou tanto da experiência que acabou incentivando o pai a viver uma nova experiência. Quando a hora de se apresentar chegou, o pequeno convenceu o pai a ir com ele. “Tocamos na Festa do Imigrante e também na Festa Pomerana, foi emocionante”, conta Irineu.
Vinícius explica que é muito legal se apresentar com o pai, mas como eles possuem apenas um bandoneon, o filho prefere se apresentar primeiro. Para o futuro, o garoto pretende continuar aprendendo e se apresentando em muitas oportunidades.