Ao longo de mais de um século, a forma de ensinar se transformou de diversas maneiras sem, contudo, ter perdido o papel primordial na formação dos cidadãos. Apesar das carteiras serem outras, das classes multisseriadas já não existirem e da relação entre professor e aluno ter sido reconfigurada, os corredores de agora mantêm a mesma vibração emanada pela energia característica das crianças e adolescentes, mesmo que nos tempos passados fosse expressa de maneira mais contida.
Essas são as principais conclusões do encontro que reuniu diversas gerações para celebrar os 135 anos da EEBM Profª Noemi Vieira de Campos Schroeder, comemorados nessa semana. A escola foi fundada em 01º de março de 1887 por uma sociedade escolar (Schulverein), e de lá para cá, marcou a vida de muitos alunos, funcionários e de toda comunidade de Testo Central Alto. Quatro gerações da família Just já transitaram entre a antiga sede da escola (ainda utilizada) e o novo prédio, edificado do outro lado da rua.
Wilfrid Just, de 63 anos, conta que os pais Rudibert e Alice (nascida Grützmacher) foram a primeira geração da família a frequentar o ensino no local. Emocionado, ele segura nas mãos um caderno que pertenceu ao pai e do qual não tinha conhecimento até poucos dias atrás. “Nós nem sabíamos que isso estava guardado aqui na escola, descobrimos recentemente e eu pensei, poxa, até do meu pai eles têm material guardado”, conta.

Wilfrid começou a estudar no local em 1966. Na época, uma única professora cuidava do ensino de todos os alunos. Além das lições em sala de aula, os estudantes tinham funções relacionadas à manutenção da escola, como a limpeza do pátio, contribuir com o cultivo da horta, rachar lenha para o acendimento do fogo no qual era cozida a merenda e assim por diante. Dos momentos mais desafiadores, ele lembra do início da vida escolar, quando sabia falar apenas o alemão e precisava contar com a ajuda dos colegas para a tradução, pois a professora só falava português. Mesmo assim, ele se dedicou aos estudos com afinco. “Apesar de trabalhar na roça, não media esforços pra estudar. Tinha que estar bom na escola e os pais cobravam”, relembra.
Mesmo depois de concluir o ensino, ele continuou fazendo parte da construção da história da Escola Noemi Schroeder. Quando os filhos ingressaram na vida escolar, ele passou a integrar a Associação de Pais e Professores (APP), ocupou cargos como o de presidente, tesoureiro e secretário. Lembra que as tardes de sábado eram marcadas pela reunião dos membros para promover a limpeza do pátio, poda da grama e assim por diante.
A filha mais velha de Wilfrid, Janice Just Jung, de 41 anos, lembra de acompanhar o pai nessas tardes de sábado e de inúmeras experiências vivenciadas na escola. Assim como ele, Janice só falava alemão quando começou a estudar, mas contou com a ajuda da professora que tinha conhecimento das duas línguas. O auxílio com as atividades fora de classe com a manutenção da instituição ainda era comum naquele tempo. “Isso era muito importante para nós, pois aprendemos a valorizar cada cantinho da escola”, ressalta.
As filhas dela, Letícia Jung, de 17 anos, e Jenifer Jung, de 14, fazem parte da quarta geração da família a estudar na escola, motivo de muito orgulho para a mãe. “No primeiro dia que trouxe elas, fui passando e explicando como era esse e aquele canto e como tinha ficado diferente.”

Letícia já se formou no Ensino Médio e confessa sentir muitas saudades dos tempos em que caminhava pelos corredores da EEBM Noemi Schroeder. “Dá saudade dos amigos, da turma, da escola, o ambiente é muito gostoso. O que ficou para a vida é essa amizade,
a empatia com os outros. Às vezes, os professores dão lições de vida muito importantes, passam mensagens boas que levamos conosco”, ressalta a jovem.
Para Jenifer, a saudade ainda não bateu, isso porque ela acabou de iniciar o Ensino Médio, então estudou no local até o fim do ano passado. Ela concorda com a irmã sobre os principais ensinamentos colhidos no local e que levará para toda vida. “As amizades, as mensagens passadas pelos professores, tudo isso fica.”
E se as irmãs já encerraram o tempo de convivência na escola, uma parte da quarta geração da família ainda tem uma longa história a escrever no local. A prima, Giovana Alice Reckelberg, de apenas seis aninhos, que o diga. A pequena ainda terá muitas boas memórias para colecionar ao lado dos colegas e amigos. Para a mãe dela, Rosilene Just Reckelberg, de 37 anos (filha de Wilfrid e irmã de Janice), as relações afetuosas construídas no período da escola permanecem até hoje. “As minhas melhores amigas são as que eu formei aqui mesmo na escola, sempre nos ajudávamos e também ajudávamos muito a escola”, revela.
Rosilene lembra ainda das aulas de Preparação para o Trabalho (PPT) e da forma como os alunos participavam das atividades. Tudo contribuiu para que ficasse guardado o sentimento de pertencimento. “Eu fico bastante orgulhosa que a escola continua sendo cuidada e que hoje a Giovana possa estudar aqui.
O orgulho também é em razão dela gostar tanto assim de estudar aqui”, conclui. Além de Giovana, o primo Victor Wilmar Woide, de cinco anos, filho de Denise Just Woide, de 32 anos, faz parte dos integrantes da quarta geração da família que apenas começaram a escrever sua contribuição na história da escola. Durante a entrevista à equipe do Testo Notícias, o pequeno vestiu um avental que pertencia ao tio, Leonardo Just (filhos de Wilfrid e irmão de Janice, Rosilene e Denise), de 34 anos.
Ele destaca uma situação curiosa com relação às mudanças entre as gerações. “Nós vínhamos para a escola para aprender o português. Atualmente, os alunos vêm para cá para apreender o alemão”, reflete. De quando era aluno, lembra que a aula favorita era a de Educação Física. “Na época, não tínhamos quadro, coberta como há hoje. Então, se chovia, tínhamos que ficar dentro da sala com aula teórica. Eu vejo esse avanço que a escola teve no quesito estrutura como algo muito interessante”, destaca.
Para a mais jovem entre os quatro irmãos, Denise, a recordação de quando Janice a trazia para a aula de bicicleta ainda permanece vívida. Assim como o fato de que todos acompanhavam o pai na época em que ele participava da APP e realizava tarefas para manter a estrutura da escola nos fins de semana. “Muitas coisas me marcaram aqui. Participei da fanfarra por quatro anos e também dos Jogos Estudantis, então tivemos a oportunidade de conhecer pessoas de outras escolas.” Ela acabou se afastando um pouco das atividades da instituição no decorrer do tempo.
Mesmo assim, o vínculo foi mantido pelo acompanhamento das duas sobrinhas mais velhas, mas o retorno ao ambiente aconteceu mesmo por conta de Victor. “A gente percebe uma evolução muito grande. Por exemplo, já no primeiro ano ele tem ensino bilíngue, estudando inglês junto, vemos que avançou muito mesmo”, reflete. 21 anos de dedicação
Francisco Carlos Valle, de 67 anos, foi diretor da escola entre os anos de 1988 e 2009, quando ainda era pertencente ao estado.
Ele descreve as responsabilidades que cabiam ao diretor na época e as compara com a atuação de um síndico. “Se quebrava uma vidraça
tinha que correr atrás para comprar o vidro, contratar alguém, faltava merenda tinha que partir para o mercado, tudo era feito pelo diretor, me sentia o sindico do prédio. Se acontecia um acidente, o diretor levava para o hospital ou para a casa dos pais e, de lá, eu era solicitado para acompanhar a criança”, explica.
Durante o período em que se dedicou à escola, a estrutura também era muito diferente. A prática da Educação Física, por exemplo, ocorria no terreno de chão batido, pois não havia quadra. Encontrar professores habilitados também era algo desafiador e, muitas vezes, pessoas que possuíam a formação de “2º grau” eram convidadas a lecionar para preencher as vagas. Havia apenas uma merendeira na escola e a APP se encarregava de contratar mais alguém para ajudar.
Como citou Wilfrid, a limpeza do pátio também cabia à associação. Já os alunos contribuíam com a limpeza da sala ao fim das aulas. “Quando comecei aqui, a escola era constituída dessa parte do lado direito da rua com mais duas salas de aula aqui”, recorda. Nos momentos em que era chamado a participar de reuniões na gerência de Blumenau, mas estava sozinho na diretoria, nomeava um professor para responder em sua ausência.
Para ele, a municipalização da escola, que ocorreu há 10 anos, facilitou bastante as coisas e permitiu que a unidade de ensino se desenvolvesse. “Na minha época, se eu quisesse uma reforma ou pintura da sala, precisava solicitar na Gerência Regional em Blumenau e esta solicitava a Florianópolis. Como a escola era pequena, era difícil de ser atendida”, avalia. Todos os desafios enfrentados o fizeram valorizar ainda mais a evolução que a EEBM Profª Noemi Vieira de Campos Schroeder alcançou.
Prova disso é que Francisco pediu ao filho que matriculasse os netos, Carolina Valle, de 10 anos, e Benício Valle, de seis anos, nessa escola. “Hoje em dia, vejo como a escola cresceu e sinto orgulho de ter feito parte dessa história, de ver que ela está nessas condições”, pontua. Carolina frequenta atualmente o 5º ano, ela conta adorar o contato diário com os amigos, professores e também que gosta muito de estudar.
Para ela, durante o tempo em que precisou ficar afastada das aulas presenciais, na pandemia, sentiu muita falta. “Fiquei muito feliz de poder ver meus amigos de novo, estava com saudade deles e dos professores”, conta.
Sabendo que o avô foi diretor da escola por um longo período, ela aproveita as conversas com ele para matar a curiosidade sobre como as coisas eram na época. “Eu perguntei se os alunos antigamente bagunçavam bastante”, confidencia. A menina de apenas 10 anos reflete sobre os longos anos de atuação da escola. “Muitas pessoas já devem ter passado por aqui, tiveram sua história nessa escola, momentos bons e ruins.”

Os benefícios da municipalização
O secretário de Educação e Formação Empreendedora de Pomerode, Jorge Luiz Buerger, comentou sobre a rica história da EEBM Profª Noemi Vieira de Campos Schroeder e descreve a ocasião do aniversário com o sentimento de gratidão a todos que contribuíram para a construção dessa história.
“Houve uma preocupação das famílias em garantir esse direito para as crianças. Hoje, somos muito gratos por poder garantir esse nível de atendimento, adequando à realidade atual. Prova disso é que a Escola Noemi Schroeder é bilíngue, então tem um diferencial com relação a outras escolas do município”, comenta.
Jorge comentou ainda sobre as mudanças após a municipalização. “Tem um ditado antigo que diz que ‘o olho do dono engorda cavalo magro’. Tivemos relatos aqui do quanto era difícil o contato com a gerência de Blumenau e Florianópolis.
Com a municipalização, há uma proximidade maior. Temos uma diretora que mora em Pomerode, que é da cidade, tem reuniões constantes com diretores de outras escolas, temos reuniões semanais, eu, como secretário, posso vir na escola, o prefeito vem na escola. Municipalizando, fica mais próximo de nós, mas não perdeu a essência, que é o cuidado e a presença da família junto com a escola, e isso já vem de antes e não se perde”, finaliza. A experiência através das gerações.
O ex-aluno Ilário Reinke, de 72 anos, e a ex-funcionária Elfrieda Reinke, de 76 anos, trazem consigo a lembrança de outros tempos e compartilham as histórias com o neto Nicolas e a bisneta Letícia. Ilário conta que na sua época havia apenas o antigo casarão (do lado direito da rua), que ainda não contava com a ampliação feita mais tarde.

Era preciso buscar água com o balde no poço que ficava no pasto. A professora era rígida, o lanche era levado pelos próprios alunos e ele descreve como os primeiros dias foram
desafiadores. “Com oito anos, entrei na escola e não sabia nem uma palavra em português. Chorei durante a primeira semana toda, pois, antigamente, não saíamos de casa nem pra ir na venda”. Aos poucos, as coisas foram melhorando e agora ele sente muita felicidade
em poder participar da vida escolar do neto e da bisneta, assim como participou do tempo em que os filhos estavam por lá.
Nesse quesito, Ilário e Elfrieda lamentam que a chegada da pandemia tenha afastado ambos da convivência mais próxima em sociedade, já que precisam cuidar da saúde. Elfrieda conta que não lembra com exatidão quantos anos ou a data em que trabalhou no local, mas recorda muito bem que havia 110 alunos matriculados no período em que era merendeira.
Muito do que era servido no lanche vinha da horta da escola ou era trazido pelos alunos. Segundo ela, houve momentos de dificuldade, mas o saldo é muito positivo. “Eu gostava muito de trabalhar aqui. Além de tudo, morava pertinho. Houve sempre muitas coisas boas”, explica.

A continuação do legado
Desde 2017, a diretoria da escola está a cargo de Elisângela Souza Saiber da Silva. Atualmente, a escola possui 265 alunos e viveu anos de muito crescimento,
seja no número de estudante ou na estrutura. “É um sentimento de gratidão estar à frente dessa equipe. A escola se tornou bilíngue, todo o legado, todo o processo com os
professores, de trabalho, de construção, uma comunidade muito ativa, muito participativa, uma APP muito atuante. Isso faz com que o nosso trabalho seja também muito rico. Eu sempre digo que sozinha eu não faço nada se não tiver apoio da direção e da comunidade.” Durante as três décadas de sua relação com a educação, ela destaca o amor que traz consigo pela profissão. “Sou apaixonada pela educação, amo o que faço, quem trabalha comigo vê isso claramente e estou sempre em busca do melhor para a escola, para as crianças e pelos professores. É essa paixão que nos move”, ressalta. Dentre as riquezas preservadas ao longo dos anos, está o casarão que serviu como sede da escola e sua ampliação, ainda utilizados para ministrar aulas a duas turmas regulares e outras
de ensino bilíngue. No futuro, com uma nova ampliação da sede, a pretensão é de que o local receba somente as turmas de ensino bilíngue e funcione como um elemento vivo da preservação histórica e cultural. Em 2020, uma reforma no piso e vigas foi concluído na antiga estrutura para garantir que ela seja um reduto de aprendizado por muitos anos.
Sobre a comemoração dos 135 anos, uma atividade foi realizada com os alunos na terça-feira, dia 1º, para marcar a data. Eles puderam ir à escola fantasiados e houve um momento de descontração para as turmas. A festa que estava sendo planejada, no entanto, não pode ocorrer. Dessa forma, atividades acontecerão no decorrer de todo 2022 para comemorar esse importante marco. Entre elas, o resgate histórico, uma gincana
e outras ações.