Uma tradição mantida há centenas de anos, um ofício resgatado e compartilhado pelas cidades por onde passam. Os alemães Lasse Mayer, Felix Thiele e Adrian Blendinger têm chamado a atenção também em Pomerode. Há algumas semanas os Wandergesellen estão na cidade e, como de costume, procuraram um lugar para aplicar o seu ofício. “Chegamos ao Brasil faz um mês e meio e estamos há duas semanas em Pomerode. Na semana passada começamos a restaurar esse telhado”, conta Felix.
A construção enxaimel em que os três trabalham para restaurar o telhado é conhecida como Casa Fischer, foi construída em 1899/1900 e está localizada no Ribeirão Souto. Por lá, o carpinteiro R.frd. Zi Meyer Lasse (Rechtschaffener Fremder Zimmermann), o telhadista R.frd. Schi Thiele Felix (Rechtschaffener Fremder Schieferdecker) e o marceneiro R.frd. Ti Blendinger Adrian (Rechtschaffener Fremder Tischler) trabalham ao lado do carpinteiro e construtor de telhados, John Wirth. “Removemos manualmente toda a estrutura e estamos restaurando com as ferramentas para madeira, o que está bom vamos colocar de volta e o que está ruim será substituído”, explica Felix.
Os Wandergesellen vieram de diferentes cidades da Alemanha e se encontraram no caminho, algo muito comum para os artesãos que se dedicam a preservar essa tradição centenária. Eles costumam viajar sozinhos, mas quando se encontram podem compartilhar conhecimento. “Lasse é de Flensburg, bem ao Norte e eu venho de Köhl, que é no Oeste. Já o Adrian é de Stuttgart, portanto viemos do Norte, Oeste e do Sul da Alemanha. Ficaremos em Pomerode por cerca de um mês e meio e vamos seguir, então, para o Paraguai e a Argentina”, afirma.
Além das vestimentas características, os três artesãos seguem à risca todos os costumes herdados pelo ofício mantido há muitas gerações e considerado Patrimônio Cultural Imaterial. E para exercer a função de um Wandergesellen é preciso estudar uma profissão de artesão ou mestre artífice, que pode ser como carpinteiro, marceneiro, ou pedreiro por exemplo.

Na Alemanha, eles tiveram aulas práticas e teóricas por três anos, depois saíram pelo mundo, visitando várias cidades em busca de oportunidades para praticar tudo o que aprenderam. “A tradição determina que o tempo fora de casa deva durar três anos e um dia. Nesse período conhecemos outras culturas, aprendemos com outras pessoas que conhecem mais técnicas e sempre temos algo novo para levar de volta a nossa casa.”
Seguindo a tradição, Lasse ainda tem um ano e meio de trabalho pelo mundo. Já Adrian e Felix concluíram o tempo necessário, mas acreditam que ainda não aprenderam o suficiente. “Nós mesmos decidimos que ainda iríamos viajar para aprender mais, até que estivéssemos satisfeitos.”
Os Wandergesellen são categóricos em afirmar que os ensinamentos que tiveram ao longo do tempo de viagem vão muito além da experiência com o ofício. “Isso não tem como definir em uma palavra, levaria horas para explicar. Acho que todos nós aprendemos muito com todas as pessoas. Cada pessoa, cada cidade, cada cultura é diferente. Aprendemos a entender porque existem outras formas de fazer, ferramentas, as diferenças de cada coisa. Existem ferramentas em alguns países, que em outros nem existem. Demoraria horas pra dizer por onde passamos e tudo o que levamos na bagagem.”

Experiências únicas que ganham uma nova página com o que Lasse, Adrian e Felix estão vivendo em Pomerode. “Estamos muito felizes porque é uma ótima sensação poder desmontar algo tão antigo, restaurar e trazer de volta à originalidade. Também é uma sensação muito maravilhosa de vir até o Brasil e encontrar aqui casas enxaimel, jamais imaginávamos que aqui haveria essas casas, que até mesmo na Alemanha são raras”, garantem.
Curiosidades sobre os Wandergesellen
Além das vestimentas características, trajes usados para que eles pudessem ser reconhecidos pelo mundo, os Wandergesellen (viajante-aprendiz), carregam consigo as ferramentas necessárias para a prática do ofício e uma caderneta onde são feitas todas as anotações sobre cada local por onde passam e trabalham. Faz parte da tradição, ainda, eles coletarem selos e carimbos, bem como um breve texto da pessoa que os contratou, como forma de registro de toda a viagem.
Os que concluem a aventura são recebidos com uma calorosa festa de boas-vindas na cidade natal. No ritual da partida, enterraram uma garrafa de cachaça, que será aberta no retorno para casa, durante uma festa que pode durar até dois dias.