Foram 56 dias de uma batalha sem tréguas, 16 cirurgias, 18 tomografias, três internações na UTI, muitas dúvidas, lágrimas, entrega total dos pais, empenho da equipe médica, busca por recursos e orações. Os combustíveis para enfrentar essa longa jornada? A retribuição expressa por um sorriso capaz de iluminar o mais cinzento dos dias e a solidariedade de conhecidos e desconhecidos. Essa é a história de Nicoli Spredemann e dos pais Rosiana e Ivonei.
Nicoli, agora com 16 anos, nasceu com hidrocefalia e, desde o momento em que chegou ao mundo, trouxe consigo a força de uma guerreira, a resiliência de uma lutadora e o coração de uma carinhosa menina. Recém-nascida, ficou no hospital por três meses seguidos e teve uma válvula implantada para tratar a hidrocefalia. O equipamento foi substituído quando ela tinha seis meses e não apresentou problemas por 15 anos até que, há alguns meses, tudo mudou.
Em um tarde até então comum de fevereiro, a menina foi descansar após o almoço como sempre faz, mas, ao acordar, sentiu que algo estava errado. A mãe notou os sinais e, com isso, se iniciou uma sequência de idas ao hospital e muitas dificuldades a vencer.
A batalha
Na primeira unidade de saúde de Blumenau a qual a família se dirigiu, o atendimento não foi bem sucedido, pois não havia vaga, uma vez que a pandemia chegava ao auge. No dia seguinte, eles então foram para o Hospital Santa Catarina. “Entrei desesperado no pronto-socorro pedindo ajuda. Eles logo vieram e acolheram a Nicoli”, explica Ivonei.
A tomografia mostrou uma obstrução na válvula, era preciso substituí-la. Ocorreu a primeira cirurgia e a consequente internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Nicoli e os pais voltaram para casa após os dias de internação. No entanto, o problema se mostrou ainda mais desafiador quando, sete dias mais tarde, a menina passou mal novamente. O problema era o dreno implantado na região do abdômen e a falta de absorção do líquido. Mais uma cirurgia, internação e retorno para casa.
Dessa vez, foram oito dias em casa até outra intercorrência. O médico responsável optou, então, por retirar a antiga válvula. Foram diversas intercorrências, complicadas cirurgias, entradas na UTI e 26 dias no hospital. Mais uma vez, a família pôde voltar para casa, mas o período entre a alegria e a preocupação durou somente 14 dias.
“Foi nessa vez que o médico me disse: ‘Mãe, eu não sei mais o que fazer, porque o corpo não absorve. Não posso mais colocar ali. Vou pedir ajuda de outro médico’. Ele perguntou se eu aceitava. É claro que disse sim”, conta Rosiana.
Nicoli já havia enfrentado longas provações até então. Com a utilização de diversos antibióticos, as veias da menina já não suportavam por longos períodos e a solução era providenciar um acesso central.
O profissional responsável pelo acompanhamento da Nicoli retirou, então, a válvula que estava no abdômen, já que o corpo da menina não estava se adaptando à função. Outros dois médicos acompanharam o procedimento. Na saída, uma alternativa foi apresentada à Rosiana. “O cardiologista disse que a única opção que tínhamos era colocar na veia arterial do coração. Achei aquilo assustador, mas a outra escolha possível, para evitar o procedimento, era a de que Nicoli ficasse no hospital por cerca de dois anos direto para tratar o abdômen por meio da derivação externa”, relata a mãe.
Um novo cateter, feito com material antibactericida para evitar infecções, foi trazido do exterior para ser implantado em Nicoli. Com a autorização da família, a cirurgia aconteceu dois dias mais tarde. Apesar de alguns sustos, foi um sucesso!

é a marca registrada de Nicoli. FOTO: Laura Sfreddo
Rotina intensa
Rosiana e Ivonei passaram por uma verdadeira maratona durante as semanas de internação e procedimentos. Além da preocupação, das dúvidas e do desejo de ver a filha bem, o cansaço tomou conta de ambos. Rosiana passava os dias no hospital acompanhando a filha e, à noite, Ivonei assumia o posto. O esgotamento físico e emocional atingiu ambos. Ivonei se emociona ao agradecer a empresa em que trabalha, a Netzsch. “Eles anteciparam minhas férias, primeiro 15 dias, depois, nos últimos dias de internação, quando tudo ficou muito complicado, concederam mais 15, assim pude ajudar a Rosiana e a Nicoli. Contei com a compreensão deles e agradeço imensamente por isso”, enaltece.
Para contextualizar a grandeza e a diferença que a solidariedade e a empatia exerceram na história da Família Spredemann, é preciso dizer, ainda, que durante a caminhada foi necessário o apoio de muitas pessoas, uma vez que os custos com idas a Blumenau, procedimentos médicos, itens de higiene e alimentação e outras despesas se tornaram muito altos. Uma Vakinha ganhou forma através da iniciativa da amiga Gabriela e arrecadou R$ 16 mil para ajudar com as contas. Cada pequena doação ou gesto de acolhimento foram suavizando o peso da carga, dia após dia. “Nós íamos e voltávamos de táxi, por várias vezes, Irani e Rui nos auxiliaram com as corridas. Em outras, familiares quitaram o valor da viagem, ou ainda, nos levaram e buscaram. Tudo isso fez uma enorme diferença para nós”, contam Rosiani e Ivonei.
Rosiana ressalta que há ainda muitas pessoas a agradecer. “Os avós Werner e Asta, a avó Íris, os responsáveis pelo serviço de táxi Irani e Rui, as dindas Verônica e Juliana, primos, tios e tias, a Kdtex, nas pessoas de Celia e Sérgio, o Grupo Kyly, a Netzsch, como Ivonei já mencionou, a Gabriela, toda a equipe do hospital Santa Catarina, e aqueles que contribuíram com a Vakinha e donativos, vocês tiveram um papel muito importante na recuperação da Nicoli”, destaca.
Os pais revelam ainda que, apesar de todo o desafio enfrentado, a relação da família com a equipe do hospital se tornou muito próxima.
Nicoli tem uma irmã mais nova, a Manuela, de cinco anos. No último dia de internação, a própria equipe quis conhecer a caçula e os pais compraram chocolates para distribuir. Assim, com sua bolsa favorita, Nicoli percorreu os corredores do hospital para presentear a todos os funcionários que encontrava com um chocolate e um sorriso que carregavam uma única mensagem: gratidão.
O futuro e a alegria
Daqui por diante, o que a família espera é a volta da rotina. Nicoli já retomou algumas de suas atividades favoritas, dentre elas, escutar rádio. Ela, inclusive, é fã de um dos locutores da Rádio Pomerode, Flávio Strey, a quem tem o sonho de conhecer pessoalmente. “No dia do aniversário da Nicolli, ele mandou uma mensagem pelo WhatsApp, deixando ela muito feliz. Também já mandou mensagens no ar”, contam os pais.
Inclusive, para que a filha pudesse se distrair enquanto estava internada, os pais compraram um pequeno rádio para ela ouvir os programas apresentados por Flávio. “Se houver alguma Live com a participação dele ou os próprios programas, ela sabe o horário e acompanha até o fim.”
E é a alegria e o sorriso de Nicoli, tão comuns aos familiares nos últimos 16 anos, que eles mais desejam preservar. “Ela sempre foi assim, calma, com um sorriso estampando no rosto e nos dando força a cada dia. Ela é o nosso exemplo”, finaliza Rosiana.