Quando criança, achava muito curiosa a atitude de um tio do meu pai. Pela minha percepção infantil, ele era muito, mas muito idoso. Percebo agora que jamais soube a idade ao certo. Bom, voltando ao assunto, o zio (tio em italiano) tinha um costume que só agora entendo. Quando perguntávamos: “tudo bem zio?” Ele respondia, vez por vez: “Ah, não. Me dói aqui, sabe”, apontando para alguma parte do corpo.
Eu pensava: “como pode uma pessoa nunca estar bem?” E lá ia o tio morro acima, voltando de sua caminhada quase diária. O zio sempre levava consigo balas de hortelã, e compartilhava com a gente. Fato esse que eu, particularmente, adorava.
Quando ele partiu para a morada eterna, senti falta do: “Ah, não. Me dói aqui, sabe”, das balas de hortelã e também daquele jeito curioso de encarar a vida. Porque, para sermos honestos (me dirijo especialmente a você com mais de 30), tem algum dia em que você abra os olhos pela manhã e não dói nadinha no corpo? Ou não tem logo de cara um problema te aguardando? Acho que o tio sofria de uma honestidade fugaz, aliada à escolha de focar no ponto negativo do dia. Aos meus olhos, isso o tornou um ser único e, de certa forma, divertido. No entanto, é um exemplo que não pretendo seguir.
Ah, mas tá chovendo! Mas tô com dor de cabeça! Ah, mas tá frio! Ah, mas nunca ganho na rifa! É claro que todos nós já sentimos vontade de exercer a mais profunda honestidade ao respondermos a corriqueira pergunta: tudo bem? Acredito que ao ignorarmos certos aspectos em nossa resposta, não estamos engando a nós mesmos ou o desavisado que perguntou, mas sim, escolhendo que, apesar dos males, estamos bem. É como diz minha avó: tirando o ruim, tá bom!
