Não sei o que acontece com meu cérebro, mas ele só decide ser criativo e feliz depois das seis da manhã. Antes disso, os sonhos são um emaranhado desconexo de rostos desconhecidos, corredores infinitos e telefones que não funcionam, isso quando não se transformam em pesadelos. Mas quando o céu começa a clarear e o corpo tenta aproveitar os últimos instantes do calorzinho oferecido pelo cobertor, é aí que as histórias transmitidas pelo streaming que habita a minha mente, mas que não permite escolha de conteúdo, começam a ficar boas. Pena que é justo nesse momento que o despertador decide cumprir seu papel cruel.
Como uma jornalista de 36 anos, mãe de um pequeno ser de um aninho que acorda com energia suficiente pra iluminar uma usina. Portanto, em seguida à função “despertador” do celular, vem a versão “despertador” do bebê.
Essa manhã, por exemplo, eu estava na serra. Não a Serra do Rio do Rastro de verdade, mas uma versão que meu inconsciente inventou com direito a um chalé rústico incrível e um cafezinho recém passado servido na varanda.
Mas o celular tocou. Não uma vez, nem duas. Tocou como se o mundo estivesse prestes a acabar. E antes mesmo de abrir os olhos, ouvi aquele gritinho familiar que se traduz em: levanta mamãe, já é dia.
Adeus, serra. Adeus, trilha em meio à neblina e o mais absoluto silêncio.
Entre levantar, preparar a mamadeira, dividir as tarefas do início da manhã com o marido e tentar lembrar onde deixei meu celular (parece irônico, mas ele sempre parece sumir depois de me acordar), percebi que essa é a nova rotina. O passeio na serra produzido pelos meus sonhos sempre perde para o pequeno mundinho aqui de casa, com suas fraldas, brinquedos espalhados e olhos grandes me olhando a boquinha pronuncia: “Máááá!”
E quer saber? Mesmo que meu cérebro queira escrever roteiros dignos de cinema justo no último minuto de sono, é esse desfecho aqui que realmente importa. Acordar com um gemidinho que vira sorriso, com um alarme que me arranca dos sonhos, mas me entrega o que há de mais real: o agora, bagunçado e cheio de amor.
E quem sabe amanhã, a programação do meu streaming reproduza o próximo capítulo da série na serra, para que eu saiba o que tinha ao fim daquela belíssima trilha. Caso não faça parte da grade dessa noite, está tudo bem, a realidade me compensa.