Não somente de grandes pilotos, com fama internacional, é feita a pista do Morro da Turquia. A história, dessa que é considerada uma das melhores do Brasil, começou no final da década de 1980. Na época, Hilário Rocha realizou sua primeira prova de Downhill (DH) em Pomerode na Estrada do Morro do Saco, em Pomerode Fundos. “A pista era pela estrada, fechávamos no topo e no final da descida. O esporte não tinha fama por aqui e os atletas que se aventuram nem bicicleta full tinham, desciam de rígida mesmo.”
Pouco tempo depois, Rocha, como é conhecido, reuniu seu primo Vilmar Weber e alguns outros amigos para desbravar o antigo traçado de uma estrada no Morro da Turquia. “Eu nunca abri uma trilha nova, sempre procurava resgatar um antigo traçado. Então, eu sabia que existia uma antiga estrada saindo da propriedade do Sr. Conrado Ott, local em que hoje está o Alles Park, e subia sentido Morro da Turquia, até onde hoje é a largada do Downhill, próximo às antenas da extinta TV Coligadas.”
Foi em 1995 que a história da icônica pista começou a ser contada. “Quando nós chegamos lá no topo, eu, o meu primo e mais um rapaz de sobrenome Poltronieri, começamos a descer por cima da ‘copa’ do morro. Precisávamos achar o local com a melhor descida, parte do traçado começou totalmente do zero. Parecia loucura para alguns, mas aquele era o começo de tudo.”
Por longos fins de semana, após mapear a descida, Rocha e os amigos trataram de limpar a trilha e realizar os ajustes necessários para que as provas pudessem ser realizadas no local. “Se não estou enganado, foi um total de oito semanas, basicamente nos reuníamos aos sábados e domingos. O Downhill precisa obrigatoriamente descer, pode ter subidas curtas e leves, por isso demorou até fazermos o traçado para chegar até o Pavilhão.”
Com os ajustes necessários, e as devidas autorizações dos proprietários dos terrenos, a primeira prova reuniu cerca de 150 atletas. “Aquilo foi algo grandioso para a cidade. Depois, em 1998, reunimos cerca de 250 atletas, essa foi considerada a maior prova no Brasil naquela época, nenhuma outra reunia tantos pilotos.”
Um ano antes, em 1997, Rocha teve a oportunidade de ir ao Mundial realizado na Suíça, acompanhando a equipe de Downhill como mecânico. “De lá trouxemos muita coisa para a pista de Pomerode. Fazíamos as provas para estimular o uso da bicicleta e incentivar novos atletas de DH.”
Rocha realizou, durante muitos anos, os campeonatos catarinenses da modalidade e criou também o Campeonato Sul-Brasileiro de DH, Dual Slalon, Up Hill e XCO, foram oito anos de provas realizadas. “Depois de um tempo acabamos deixando o projeto de lado pela falta de apoio. Ficávamos semanas limpando a trilha e organizando tudo, inclusive troféus, mas quase não tínhamos o suporte necessário.”

A trilha ficou fechada até 2002 quando, após um desmoronamento, Rocha subiu pra dar uma olhada se o trabalho que tinha realizado anos antes poderia ser o causador do problema. “Por sorte vimos que não. Mas o DH acabou esquecido na cidade. Em 2006 tivemos a oportunidade de reativar a pista para os Jogos Abertos que foram sediados por Pomerode, Timbó e Indaial.”
Rocha relembra que foi nessa mesma época que novos rostos pomerodenses surgiram para o Downhill. Incentivados pelos pais, os novos pilotos do município precisavam de um local para treinar. “Meu filho, Rafael Mohr, começou no Downhill por causa da prova do Rocha lá em 1998, ficou tão inspirado que tive que comprar uma bike pra ele”, conta Ronildo Mohr.
Depois de dois anos, um novo desafio surgiu, causado pelas catástrofes de 2008. “Naquele ano a pista da Turquia foi desativada porque caiu uma barreira, após as chuvas que assolaram o município. Tínhamos que achar um novo local.”
Na época, as provas foram transferidas para a nova pista aberta no Morro da Acaen, sendo realizadas entre os anos de 2009 e 2011. “Até ele ser destruído também por uma catástrofe natural.”

Foi em 2012 que os pilotos de Pomerode decidiram que era hora de voltar para a saudosa pista de DH do Morro da Turquia. “No final de 2011, o Rafael teve a ideia de dar uma vistoriada na pista do Morro da Turquia, para ver como estava o estado dela. Vimos que, com algumas mudanças na trajetória, a pista poderia ser novamente reativada”, relembra Ronildo.
E foi após um trabalho voluntário de limpeza e manutenção que ela foi reaberta com a ajuda dos pais Ronildo Mohr, Sérgio Tiedt e Guilherme Freiberger, e pelos pilotos que faziam parte da equipe Hot Pepper Racing Time, fundada em 2010: Rafael Mohr, Henrich Tiedt, Augusto Henrique Freiberger, Eduardo Raduenz, Anderson da Silva, Bruno e Matheus Kurth e mais alguns colaboradores, que entraram para o grupo naquele ano. “Após a abertura da pista, com o novo trajeto, a prova inaugural foi realizada no dia 12 de março de 2012.”
Segundo Ronildo, em 2014 o traçado do circuito sofreu uma nova alteração em função de uma licença junto a proprietários, alterando parte do percurso e a chegada para o estacionamento do Parque Eventos. “Após todas essas mudanças, foram realizadas várias provas estaduais, os Jasc e agora dois campeonatos brasileiros, em 2023 e 2024”, afirma Ronildo.

Um legado para as novas gerações
É dessa forma que Rocha define o trabalho iniciado há 29 anos. Atualmente, a pista, que tem uma extensão de pouco menos de 2 km, já recebeu por dois anos consecutivos o Campeonato Brasileiro de Downhill, considerada a competição mais importante da modalidade no país. “Tenho muito orgulho de tantas histórias e do legado dessa pista com a assinatura da Família Rocha.”
Atletas de renome internacional não cansam de tecer elogios à organização, à estrutura e à descida épica. “Os pilotos dizem que essa é a melhor pista ativa do Brasil, embora seja curta tecnicamente e ainda falte uma estrada paralela para o resgate”, explica Rocha.
Hilário revela que, apesar de ter traçado o circuito, nunca se aventurou pela pista. “Criei a pista para os loucos descerem. Ela ficou famosa pelo grau de dificuldade, mas também pela facilidade. Dizem que tem a quantidade certa de pedras e de lama. É uma pista técnica, mas também fácil e gostosa de descer. Acredito que eu tenha ajudado a construir a história do Downhill em Pomerode e coloquei a cidade no mapa das grandes provas, com uma trilha que começou de forma despretensiosa há muitos anos.”

Rocha, que foi atleta de Speed, começou a competir em 1979, desde lá nunca mais largou o universo da bike. Já organizou provas nas modalidades de BMX, Triatlo, Speed, MTB, Downhill, Up Hill, Dual Slalon, Cross Country, XCO e Bike Trial. Já foi coordenador, técnico de equipe, lojista, e colaborador da Federação Catarinense de Ciclismo (FCC).
Há dez anos comanda, ao lado da família, o temido Desafio dos Rochas, que em 2024 reuniu mais de mil atletas. “O esporte do pedal sempre foi a minha vida, a bicicleta desde que entrou na minha história não saiu mais, seja como atleta, dirigente e organizador de prova. O universo sempre conspirou a meu favor, a gente tem amigos no mundo inteiro e isso é pela minha paixão por bicicleta. Fico feliz em ter deixado esse legado aos atletas e para Pomerode.”