No dia 4 de março de 1939, nasceu a que se tornaria uma mulher de exemplo. Léa Hoge Hass tinha dentro de si a vontade de ser independente. Por isso, mesmo antes de completar 14 anos, já deixava claro sua vontade: trabalhar fora e ganhar seu próprio salário. A personalidade decidida e dinâmica já despontava quando adolescente.
Com o desejo, o escrivão do cartório, na época Wadislau Constansky, pediu ao pai de Léa para que deixasse a filha auxiliá-lo na empresa. Com a resposta positiva do patriarca, ela começou a trabalhar como aprendiz e auxiliar no dia 4 de dezembro de 1952, quando o cartório ainda era chamado de Escrivania de Paz do Distrito do Rio do Testo. No entanto, para isso, precisou fazer um curso de datilografia em Blumenau.
Como aprendiz, não recebeu nenhum salário durante cerca de dois a três meses. Quando o primeiro pagamento chegou, Léa demonstrou ainda mais a vontade de trabalhar: utilizou os 150 cruzeiros recebidos para adquirir uma bicicleta. O objetivo? Poder ir e voltar do serviço.
Com o curso, ela pôde utilizar a máquina de escrever para datilografar todos os documentos e realizar os registros de casamentos, óbitos, escrituras e outros. Como, na época, tudo era feito a mão com caneta-tinteiro, Léa fez parte de uma inovação.
Ao passar dos anos, ganhou experiências e presenciou momentos únicos da vida de cada pomerodense. Fez registros de casamento, certidão de nascimento, separação dos casais, divisão de bens e toda a parte burocrática necessária perante a justiça. Além disso, realizou todas as lavraturas de escrituras, protestos de títulos, reconhecimento de firmas e autenticações.
Estar à frente de tudo isso fez com que toda a comunidade conhecesse Léa. Por isso, muitos a procuravam para ouvir seus conselhos e opiniões. Trabalho feito de forma gratuita por todos esses anos. Estudar também nunca foi problema para ela, já que sempre foi muito interessada nas leis, normas e regulamentações. Devido ao conhecimento adquirido, muitos pomerodenses lhe procuravam para tirarem dúvidas sobre negócios, transferência de imóveis e em casos de separação, por exemplo.
Aos 20 anos, em 1959, casou-se com Wigold Hass que, depois de se aposentar como contador, optou por auxiliar a esposa de forma voluntária no cartório. O casal teve dois filhos, Leane, engenheira civil e que, depois de 25 anos de trabalho, foi também trabalhar com a mãe no cartório; e Marcos Conrado (mais conhecido como Chico Hass), engenheiro agrônomo, mas que, depois de um convite da mãe, assumiu o cargo de Tabelião Substituto no cartório.
Quando Léa atuava já como escrevente, após a emancipação do Distrito de Rio do Testo, elevado a município em 1959, a Escrivania de Paz dividiu-se em dois cartórios e o titular optou por exercer as funções de tabelião, ficando vago o Ofício de Registro Civil. Em 1969, ela prestou concurso público e foi nomeada como oficial titular do Cartório de Registro Civil, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas da Comarca de Pomerode. Quando ocorreu a aposentadoria do tabelião Wadislau Constansky, prestou novo concurso e foi aprovada em primeiro lugar, sendo nomeada em 1976 como titular do Tabelionato de Notas e de Protestos.
Em 2010, foi homenageada na Câmara Municipal de Vereadores de Pomerode pelos serviços prestados à sociedade quando completou 58 anos de profissão. Outra homenagem recebida era vista no dia a dia, quando as pessoas que recebiam seus conselhos lhe agradeciam e lhe davam presentes, como galinhas e verduras. Mesmo com o passar dos anos, Léa não deixou nem por um momento a vivacidade de lado. Continuou firme e forte, se dedicando integralmente ao trabalho.
Em 2020, com a chegada da pandemia e o fechamento total dos estabelecimentos, Léa e o marido precisaram ficar em casa por cerca de dois a três meses. Posteriormente, a indicação era de que funcionários que possuíam comorbidades, as grávidas e idosos trabalhassem de casa. Como dentro do cartório foi instaurado um protocolo muito rígido, Léa retornou, por desejo próprio, ao trabalho presencial e com horário reduzido, já que precisava fazer a contabilidade e assinar vários documentos. Os cuidados continuaram durante todo o ano de 2020 e Léa se manteve saudável nesse tempo.
No ano seguinte, a vacina contra a Covid-19 chegou e o casal estava com a aplicação agendada. Porém, dia 21 de fevereiro, o marido positivou para o Coronavírus. Wigold foi internado no dia 1º de março. Poucos dias depois, no dia 5, Léa também positivou. Infelizmente, ele não resistiu e faleceu no dia 7 de março aos 86 anos. Já o quadro dela esteve estável durante alguns dias.
No entanto, no dia 11, foi necessário interná-la na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Depois de diversas infecções generalizadas, ela não aguentou e faleceu aos 82 anos. No dia 1º de abril, Pomerode perdeu uma de suas personalidades mais conhecidas. Léa deixou seus dois filhos, um genro, uma nora, três netas, um neto e uma bisneta.
Com o falecimento, finalizou-se a concessão do título que ela tinha perante ao Tribunal de Justiça. O filho, como era tabelião substituto, e a filha, como escrevente notarial, levaram a serventia até dia 17 de maio, quando saiu a portaria da nomeação da nova titular designada atualmente. Como Chico Hass, por ter cargo público, não poderia assumir as funções, e Leane já estava aposentada, foram encerradas as atividades de ambos junto ao Tabelionato de Notas.
Depois de um ano de sua partida, muito do legado de Léa ainda é lembrado, não apenas pelos seus familiares, mas para os que tiveram o privilégio de conhecê-la. Sabemos que a dor passa e as memórias ficam, mas as lembranças de Léa ficarão marcadas eternamente nos corações de toda a comunidade pomerodense.
