Era uma quarta-feira normal, dia 16 de março de 2022. Às 9h24min, o telefone do Corpo de Bombeiros Voluntários de Pomerode toca. Quem atende o chamado é Davi Rafael Balas, de 21 anos, aluno do curso de formação. Do outro lado da linha, um bombeiro militar de Blumenau acionava a corporação pomerodense para auxiliar na ocorrência que envolveu o caminhão do Exército Brasileiro.

Davi passou então a informação para o comandante, Carlos Hein, o qual prontamente avisou que deslocariam duas ambulâncias. Como estavam em cinco bombeiros no plantão e quatro iriam para Blumenau, foi necessário providenciar uma nova equipe que ficaria na corporação caso houvesse alguma ocorrência em Pomerode. “Temos um grupo chamado ‘plano de contingência’ para quando precisamos de guarnição. 11 pessoas responderam e vieram para cá. Algumas ficaram até voltarmos e outras por um período menor de tempo”, explica Hein.
Com isso resolvido, foi o momento do deslocamento. A guarnição era composta pelo comandante Hein e Davi, além dos bombeiros voluntários Carlos Eduardo Demuth e Luciano da Luz Palhano. No entanto, ainda tinham poucas informações sobre a situação em Blumenau. Até então, sabiam que o caminhão havia caído na ribanceira e havia diversos feridos. “Pela distância, já imaginávamos que era uma coisa mais grave, já que o tempo de resposta dava praticamente acima dos 40 minutos, só não sabíamos qual era a gravidade, quantas vítimas tinham ao certo e qual a situação exata que eles precisavam ter no momento. No trajeto, ficamos sabendo que eles estavam precisando da questão das ambulâncias para atendimento”, destaca Demuth.
Quando chegaram, não houve muito tempo para que pudessem observar o cenário que os cercava. As viaturas paravam antes do local do acidente, área onde era feito o gerenciamento do transporte das vítimas. Um sargento do Corpo de Bombeiros foi o responsável, junto com integrantes do Exército Brasileiro, por organizar todo o deslocamento para os hospitais, já que era de extrema importância ter conhecimento de quem foi para qual hospital e com qual ambulância.
Segundo Hein, quando se trata de um incidente com múltiplas vítimas, a primeira equipe que chega no local fica a cargo de realizar a triagem das vítimas e estabelece prioridades de transporte de acordo com os níveis das lesões. “As vítimas são direcionadas enquanto as ambulâncias vão chegando, as mais graves vão primeiro e assim por diante até conduzir todos aqueles que precisam. Isso já estava acontecendo quando chegamos.”
A situação vista por todos que chegavam ao local pode ser comparada a encontrada em uma situação de guerra. Como, além do caminhão que caiu, havia outros dois indo para o campo de treinamento ao mesmo tempo, os soldados que não se acidentaram auxiliaram as vítimas a saírem da ribanceira para receber o primeiro atendimento. “Toda a parte de resgate, tirando o rapaz que estava preso, já tinha sido realizada, bem como a triagem e os primeiros atendimentos para quem precisava de curativo e imobilização”, destaca o comandante dos bombeiros de Pomerode.
Sobre isso, Demuth relata um diálogo que teve assim que chegou à ocorrência. “Conversei com um soldado, ele confirmou que seguia em outro caminhão e ajudou a retirar as vítimas. Você via que ele estava comovido e bem emocionado pela situação, por ver os colegas de farda nessa situação.”
Poucos minutos depois, a viatura composta por Demuth e Luciano recebeu uma vítima, uma das caronas que estava na cabine do caminhão e precisava ser conduzida até o Hospital Santo Antônio. Durante o trajeto, Luciano conversou com a mulher sobre o ocorrido. “Ela relatou que foi o primeiro incidente durante todos os anos de serviço e disse que viu a vida dela acabar ali, mas que, quando chegou lá embaixo, viu que ainda estava viva. Mesmo com dor, ajudou a fazer socorro do pessoal.”
Já Hein e Davi ficaram ainda um tempo no local da ocorrência. Depois, foram responsáveis por encaminhar o condutor do caminhão para o hospital. Ele não apresentava nenhum ferimento grave, somente escoriações pequenas, mas se mostrava abalado emocionalmente. “Naquele momento, já se tinha a confirmação de um óbito, o segundo era praticamente confirmado e existia o rapaz que estava preso debaixo do caminhão. Então tinha toda essa junção de informações”, relata o comandante.
Mistura de sentimentos e emoções
No deslocamento até a ocorrência, muitas perguntas passaram pela cabeça da equipe. Como um acidente de múltiplas vítimas não é algo visto com regularidade, os questionamentos feitos na viagem envolviam como encontrariam o local, se tudo estaria organizando e fluindo e como era o estado das vítimas, sentimento diferente de quando um incidente envolve poucas pessoas.
Hein dá um exemplo claro da diferença entre os atendimentos: “Quando se tria uma ocorrência de colisão carro e moto, por exemplo, você faz perguntas pontuais, porque normalmente se trata de uma ou duas vítimas, é possível ter um panorama melhor da situação que você vai encontrar. Lá, o número de vítimas conduzidas ao hospital era muito elevado, então você não sai esperando, mas visualizando e se preparando para situações extremas.”
Por isso, chegar no local e ver que todos os passos estavam sendo coordenados e que a maioria das vítimas estava bem, fez com que aliviasse um pouco a apreensão que sentiam. “Que bom que desses 39 que foram conduzidos ao hospital, praticamente 30 eram feridos leves e que receberam alta no mesmo dia. A situação poderia ser muito mais grave e demandar mais trabalho se tivessem mais vítimas graves. O número é elevado, mas o bom que a maioria eram leves. Chegar lá e encontrar a maior parte delas andando e se auxiliando tira um peso”, analisa o comandante.
Após encaminharem as duas vítimas para o hospital, a guarnição retornou a Pomerode, às 13h. Mesmo com o triste ocorrido, o sentimento que ficou para os quatro bombeiros foi de dever cumprido. Para Davi, por mais que não tenham atuado na zona quente da ocorrência, valeu muito ter ido e atuado da forma que puderam. “Acredito que seja de grande valia uma ocorrência dessas para o conhecimento que a gente adquire e experiência vivida.”
Já Demuth pondera que, mesmo com a gravidade da situação, a experiência foi muito boa, já que conseguiu auxiliar quando necessário. “Foi muito gratificante, ainda mais por ter ajudado o Exército Brasileiro que tantas vezes ajuda cidades de Blumenau e região.”
Para finalizar, Hein descreve o misto de sentimentos que envolve confrontar a prática com a realidade.
“Nós simulamos ocorrências com múltiplas vítimas, mas essa foi nossa primeira realidade. Que bom que teve organização e estrutura disponível. Esperamos que continue assim e, quando tivermos que prestar apoio para cidades próximas, estaremos à disposição. Continuaremos praticando e treinando, mas esperamos que não aconteça novamente por aqui uma ocorrência similar”, finaliza.